quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Uma noite na Forja

As noites de terça-feira do Baby Barioni reúne idosos nostálgicos dos tempos de boxe no Pacaembu e Ibirapuera e também garotões de academia prontos para provar seu valor ou acompanhar seus amigos. Um ambiente amistoso para os entusiastas do boxe.

A arquibancada nunca enche, mesmo sendo gratuito o ingresso para acompanhar as apresentações de amadores e um combate de profissionais no final. Ao lado de fora uma barraca de cachorro quente serve os fãs e ao seu lado está um vendedor de sucos, as bebidas ficam esfriadas num isopor de tamanho grande repleto de gelo.

Para os pugilistas estreantes lutar no Baby é como para as bandas de rock começar a tocar em pequenos bares e espeluncas, não é Las Vegas, mas tem seu charme. Um charme que não se renova, sempre há o tema do filme Rocky que foi lançado há mais de 30 anos tocando que dificilmente tem sua trilha sonora usada para animar eventos de grande porte.

Mas mesmo com o clichê cinematográfico – e que para alguns jovens funciona, pois acreditam no personalidade de Sylvester Stallone como se fosse uma santidade – o evento tem muitos méritos. Acrescenta novos valores não apenas ao esporte paulistano, mas também ao Brasil; dá a oportunidade para alguns adolescentes fazerem seu rito de passagem abandonando a infância para adentrar a vida adulta e empresta um pouco de oxigênio ao pugilismo nacional.

Um desses jovens que tem talento, mas não foi brincar de boneco lango-lango, é Tallen Augusto. O rapaz de pele morena, cabeça raspada, tatuagens pelos braços e olhos negros. Tem a aparência dos lutadores de vale-tudo e sonha com afinco em ser um dos grandes nomes desse esporte, mas sabe que para isso precisa ter uma base sólida no boxe e não apenas confiar em uma modalidade como fazem alguns atletas de jiu-jitsu tão confiantes em suas chaves de pescoço que esquecem o perigo de ser vítima de um murro no queixo.

Tallen dominou o seu rival, sua postura não é genuína da nobre arte, veio do boxe tailandês. Enquanto trocava golpes uma senhora de 35 à 40 anos chorava desesperadamente, perguntada se era mãe do rapaz que estava perdendo que ainda tinha o olho esquerdo inchado a senhora não respondia até que uma voz avisou que era realmente mãe daquele que golpeava. É o desespero de uma mãe ao ver o filho em uma situação de risco mesmo que ele esteja ganhando.

A luta de profissionais encerra a rodada, de um lado Jesus Gorces do Uruguai e do outro Marcelo Nascimento, o “Martelo”. O uruguaio tem os cabelos negros e espessos, vestia calção branco e azul remetendo ao seu país que não segurava uma ligeira saliência abdominal. “Olha lá é o Sagat”, gritou Talen aos seus amigos quando Marcelo começou a martelar.

Sagat é um vilão da série de video-games Street Fighter. Um personagem temido, mas honrado e um dos favoritos dos jogadores. De porte altivo, o senhor do muay-thai ostenta uma larga cicatriz no peito e usa um tapa-olho. Assim como o personagem virtual, Martelo golpeia pesado tanto que consegue um knockdown no 2° giro.

Porém, Jesus é um latino aguerrido e apesar de parcos recursos técnicos e físicos – participava de sua segunda luta como profissional – não desistiu e alguns membros da plateia o chamam de “Rocky Balboa” (Ele estará sempre presente na vida dos jovens, adultos e idosos).

O uruguaio não desiste, encaixa poucos socos e sofre muitos, sangra e tinge o ombro do brasileiro de vermelho. Ele veio ao nosso país para perder, mas é diferente de alguns produtos brasileiros exportados para perder na Europa, Jesus não se atira no chão.

No intervalo entre o 5° e 6° assalto Jesus Gorces desiste e não volta ao ringue. Apesar do nome não pode contar que ressuscitará no 3° dia. Marcelo tem seu “martelo” levantado pelo árbitro e comemora com os seus acompanhantes, enquanto Jesus volta ao anonimato discretamente. O ginásio começa a esvaziar, garotos voltam para casa contando suas vitórias ou lamuriando a perda de seus orgulhos.

Idosos ficam por mais tempo relembrando o período em que eles subiram naquele ringue, quando eram o alvo de todos os olhos como gladiadores no império romano se apresentando de peito nú. Homens negros e nordestinos de macacões azuis desbotados surgem para desmontar a arena. O show acabou, mas terça-feira tem mais no mesmo horário. Esta é a Forja dos Campeões.



Sagat


Sagat / Capcom



Sagat em Ação